Quando comecei a escrever um blog sobre vinhos, eu tinha na cabeça um número. Era a porcentagem dos consumidores de vinho de mesa. No Brasil, hoje, apenas 10% dos consumidores de vinho tomam os chamados vinhos finos. O resto, consome o vinho de mesa. Em 2016 foram processados 300 milhões de quilos de uva, sendo…
Quando comecei a escrever um blog sobre vinhos, eu tinha na cabeça um número. Era a porcentagem dos consumidores de vinho de mesa. No Brasil, hoje, apenas 10% dos consumidores de vinho tomam os chamados vinhos finos. O resto, consome o vinho de mesa.
Em 2016 foram processados 300 milhões de quilos de uva, sendo que apenas 32 milhões foram de uvas finas. Os outros 268 milhões, foram de uvas de mesa. Estes dados foram fornecidos pelo IBRAVIN – Instituto Brasileiro do Vinho.
Para ficar mais claro aos iniciantes, o Vinho Fino são os vinhos feitos de uvas como a Cabernet Sauvignon, a Merlot, Carmenère, Pinot Noir, Malbec, entre outras menos populares, como a Ancellotta, Alicante Bouschet, etc.
Já o Vinho de Mesa, são os vinhos feitos daquelas uvas que a gente vê no mercado. Essas uvas tem menor estrutura e potencial pra fazer vinhos encorpados e complexos. Fazem vinhos simples. São Uvas de Mesa, ou seja, para serem consumidas como sobremesa. Como qualquer outra fruta. As mais comuns: Concord, Niágara, Bordô e Isabel (esta última, um híbrido, é a uva mais cultivada no Brasil nos dias de hoje).
As uvas finas, que fazem os vinhos finos, tem, em sua maioria, origem no continente Europeu, por isso a França é famosa produtora de vinhos. Logo, as uvas da espécie Vitis Vinífera passaram a ser conhecidas como “uvas europeias”.
As uvas de Mesa nem sempre tem sua origem na América, porém, passaram a ser conhecidas como “uvas americanas”.
Nós iremos ver mais pra frente neste artigo, como esse pequeno detalhe influenciou a cultura do vinho no Brasil, e porque o mercado de Vinhos Finos ainda é tão pequeno por aqui.
Então, qual a diferença entre essas uvas?
Qual a diferença entre os dois vinhos, o de Mesa e o Fino? A uva. Exatamente. O tipo de uva de onde vem o vinho. Esta é a principal diferença entre um vinho de mesa e um vinho fino.
Você lembra quando, na escola, aprendeu sobre os reinos, famílias, gêneros e espécie? Então. As uvas do vinho de mesa e do vinho fino, são diferentes exatamente na espécie. As uvas do vinho fino, são da espécie Vitis Vinífera. Já as uvas do vinho de mesa, são da espécie Vitis Labrusca.
Abaixo, um pequeno comparativo entre uma uva americana, a esquerda (típica Vitis Labrusca) e uma uva europeia (típica Vitis Vinífera), a direita. Perceba as diferenças:
O vinho de mesa também é chamado de vinho colonial
Ao contrário do que pensa a sabedoria popular, de que o vinho chegou com os imigrantes italianos em 1870, o vinho chegou ao Brasil ainda em 1500, com as primeiras caravelas.
Lembre-se que o vinho, aqui, era utilizado como modo de higienizar alimentos, por conter álcool. Também costumava ser mais potável que a água. Sendo assim, a existência de vinho no país é bem anterior a colonização italiana.
Porém, de fato, o vinho começou a ficar popular e ser reconhecido como negócio, só a partir de 1870. Foi nessa época que os primeiros imigrantes italianos começam a chegar ao sul do país. Em 1900, já havia milhares de vinhedos plantados na região de Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul.
[su_note note_color=”#bc0000″ text_color=”#f6f6f6″ radius=”10″]CURIOSIDADEO período Colonial do Brasil vai de 1534 a 1822 (com a Proclamação da Independência, o Brasil deixa de ser colônia). O vinho dito Colonial, começa a ficar popular apenas em 1870, quando o Brasil já não era mais colônia. Logo, a denominação de “Vinho Colonial” tem relação com a colonização regional italiana no sul do país, e não com o período do Brasil Colônia.[/su_note]
Quem não tem cão, caça com gato
Ao chegarem ao Brasil, os Italianos iniciaram a produção do que eles já conheciam bem na Europa: fazer vinho. O entrave, aqui, deu-se pelo fato de não encontrarem as chamadas Vitis Viníferas (como a Merlot, Cabernet Sauvignon ou a Sangiovese e a Nebbiolo, essas últimas, uvas típicas italianas). Somente encontraram uvas da espécie Vitis Labrusca (como a Niágara, a Concord e a Isabel), as americanas.
Sem opção, os imigrantes Italianos começaram a produção dos vinhos de mesa, vinhos mais simplistas, feitos das uvas que eles encontravam por aqui. E assim deu-se o início da cultura do Vinho de Mesa no Brasil, que perdura até os dias de hoje, respondendo por 90% do consumo de vinho no país, contra apenas 10% da produção de vinhos finos.
Este dado chega a ser impressionante, quando você percebe que todo o Vale dos Vinhedos, no Rio Grande do Sul, é conhecido apenas pelos Vinhos Finos, e bem pouco pelos Vinhos de Mesa. Embora estes ainda representem 90% do mercado nacional de vinho.
Você já bebeu um vinho de garrafão?
Este é um vinho de mesa – ou vinho colonial. Aos que bebem vinho fino, o Sangue de Boi pode aparecer em conversas, invariavelmente, em tom de piada. Mas ele é um dos grandes precursores do vinho no país. O rótulo começou a ser vendido pela Cooperativa Aurora ainda em 1950, ficando popular em sua versão de 5 litros.
No final dos anos 1890, o garrafão de vinho de 5 litros tinha virado uma realidade e item obrigatório na mesa de todas as famílias de origem italiana no sul do país, tornando o consumo do vinho no Brasil, algo popular.
A uva utilizada era uma cruza entre a Vitis Labrusca e a Vitis Vinífera. A variedade era chamada de Isabel. Foi criada nos EUA ainda em 1800. Dava uma boa qualidade, resistência, e principalmente, produtividade.
O país havia recém decretado o fim do tráfico negreiro (1850), e precisava de novas estratégias para crescer. O vinho apareceu como uma oportunidade de negócio para um povo que já sabia como produzi-lo. E é daí, então, que surge o termo vinho colonial. Vindo da colonização Italiana de terras sulistas.
É possível diferenciar as uvas apenas olhando?
Sim, é possível. Mas é algo difícil de se fazer. Não é um processo fácil, e iniciantes poderão ter bastante trabalho ao tentar diferenciar apenas com os olhos.
Porém, prová-las pode ajudar. Ao pôr uma uva vinífera na boca, você pode sentir que a casa é mais grossa. Além disso, geralmente, há mais sementes na uva vinífera que na uva Vitis Labrusca, americana.
Algumas uvas viníferas tem formatos específicos de cacho e de folhas. Portanto, é necessário muita técnica e experiência para poder identificá-las. Geralmente, as uvas das quais são feitos os vinhos finos, são de tamanho menor. Como comparativo, talvez um pouco menor das que são vistas no mercado.
As uvas de mesa, essas que a gente come depois de comprar no mercado, são uvas um pouco maiores. Produzem uma quantidade maior de poupa, como você pode perceber pelas fotos acima.
Qual a diferença entre o vinho de mesa suave e o vinho de mesa seco?
Esta é uma questão popular entre os iniciantes e curiosos no mundo do vinho. Qual a diferença, e como se faz o vinho suave?
Primeiro, temos que entender o processo de transformação de açúcar em álcool. Para exemplificar, tomaremos como exemplo a cachaça. Esta bebida alcoólica, vem da produção da cana de açúcar. Nada mais é, do que a fermentação do açúcar até virar álcool.
Por um processo químico chamado de fermentação, todo açúcar tem potencial de virar álcool. É assim que o vinho é feito. A uva atinge uma maturação definida (ou seja, uma quantidade de açúcar), e então é colhida e entra para o processo de fermentação.
A adição de açúcar no vinho suave
Aqui a mágica começa, e é onde você precisa prestar atenção para entender a diferença entre o vinho de mesa suave e o vinho de mesa seco.
Quase todo o açúcar presente na uva vai virar álcool. Ou seja, em quase 100% dos casos, todo vinho, naturalmente, é seco. No Vinho de Mesa Suave, após o processo de fermentação, há adição de açúcar ao vinho, depois que ele fica pronto. Simples assim.
Para ficar suave, o vinho recebe açúcar. Exatamente como você já deve ter feito com aquele vinho seco que o seu avô serviu quando você ainda era adolescente. Se você nunca o fez, provavelmente conhece alguém que já fez.
Em tese, colocar uma colher de açúcar no vinho seco, o torna um vinho “suave”. Ou seja, no fundo, o vinho suave é vinho adoçado com açúcar.
Exceções
Há exceções, mas elas são raríssimas atualmente, ou quase nulas. Em alguns casos, a uva pode ter uma maturação tão alta, ou seja, uma quantidade de açúcar tão alta, que parte se tornará álcool, e parte continuará açúcar (chamado de açúcar residual).
Nestes casos, teremos um Vinho de Mesa Suave, sem adição de açúcar. Tal fato é raro de acontecer, pois conseguir alcançar uma maturação com nível de açúcar alto é tarefa difícil. A uva atinge um nível de maturação pleno antes de iniciar o processo de apodrecimento, porém, nem sempre esta maturação plena é suficiente para ter o açúcar necessário para formar um vinho suave “naturalmente”.
Além disso, para o produtor, vale a pena colher as uvas antes de deixá-la muito madura, afinal, quanto mais tempo no vinhedo, mais riscos de perder a produção com fenômenos naturais, como granizo ou chuvas fortes.
Os vinhos finos chamados de sobremesa ou licorosos passam por processo parecido. São extremamente doce e não tem adição de açúcar. O famoso vinho do Porto é um desses casos.
E onde se encaixa o “Vinho Tinto de Mesa Fino“?
O leitor Thiago levantou uma questão nos comentários dessa postagem, que devemos prestar atenção. Alguns produtores usam a denominação “Vinho Tinto de Mesa Fino” no contra-rótulo, principalmente. Ele continua sendo um Vinho Fino, porque foi feito de variedades de uvas viníferas (Cabernet, Merlot, entre outras).
Digamos que o vinho Fino pode ser de Mesa, mas o de Mesa não pode ser Fino. Logo, um vinho pode ser feito de Cabernet e o produtor chamá-lo de “Vinho de Mesa Fino”, mas eu não posso fazer um vinho de Concord, Isabel ou Niágara e chamá-lo de Vinho Fino de Mesa, ou Vinho de Mesa Fino.
A legislação permite o vinho Fino ser chamado de Mesa, mas não permite o vinho de Mesa ser chamado de vinho Fino.
O parágrafo 6 da lei 10.970, de 2004, diz que “No rótulo do vinho fino será facultado o uso simultâneo da expressão ‘de mesa’”.
O termo “Vinho de Mesa Fino” costuma não significar nada, é apenas uma opção do produtor. Ou em alguns casos, identifica um vinho que não tem pretensão de mostrar grande complexidade, pode se referir a um vinho de qualidade inferior (grande quantidade de produção, vinho para consumo rápido).
É importante ressaltar que essas regras servem apenas para o Brasil. Na França, por exemplo, o “Vin de Table” (vinho de mesa, em tradução literal) é feito de uvas viníferas. Lá, o Vin de Table só designa a menor das categorias de qualidade do vinho. É como se fosse uma categoria na classificação de “Reserva”, “Reservado” e “Gran Reserva”.
Resumo básico: o termo “Mesa” pode ser usado em qualquer vinho. O termo “Fino”, só pode ser usado em vinhos feitos de uvas da espécie Vitis Vinífera.
Conclusão
O vinho de mesa é feito de outra espécie de uva dos vinhos finos. Você não encontra uva Merlot, Cabernet Sauvignon ou Malbec no mercado. Mas encontra a Bordô, Niágara, Concord e Isabel (híbrida de Labrusca com Vinífera). São dessas uvas mais comuns que os Vinhos de Mesa são feitos no Brasil.
Os vinhos de mesa suaves, em sua maioria, contém açúcar. Os vinhos de mesa seco, não contém açúcar. Ou contém uma quantidade quase imperceptível.
Eu espero que eu tenha conseguido tirar algumas dúvidas sobre a diferença entre o vinho de mesa e o vinho fino. Para saber um pouco mais, eu recomendo essa matéria sobre a filoxera e essa matéria sobre o vinho colonial.
E já sabe, se ficar com dúvidas, fique a vontade para usar os comentários abaixo ou escrever um e-mail pra mim! marcos@vemdauva.com.br 🙂