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Como se planta a uva para vinho?

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Todo mundo pensa que uma plantação de uva é sempre igual. Uma típica “parreira”. Alguns raminhos de uva em cima de uma estrutura que simula um “teto”. Certo? Errado.

Há diversos modos de se plantar a uva, e cada uma tem uma finalidade diferente. Mas como as videiras são plantadas, como elas crescem? Você já pensou nisso?

Capa Postagem sobre Sistemas de Condução

Infográfico Sistemas de Conducao - Uvas e Vinhedos

A videira é uma planta que salvo em condições especiais não cresce de maneira satisfatória sem ser conduzida. E quando eu digo conduzida, é realmente isso. Caso contrário a planta nascerá sem rumo algum.

Para isso serve a estrutura de madeira que vemos nas vinhas. É importante conduzi-la à um crescimento que traga vantagens para a produção de uvas que levarão ao bom vinho que você degustará na sua casa, com os amigos.

Uma vez que sabemos que a videira, que é uma planta da família das trepadeiras precisa de uma condução, quais são os fatores que podem influenciar na escolha desse sistema de condução? O que é melhor para cada região ou tipo de vinho?

Fatores para a escolha do tipo de condução da videira

  1. Objetivo da produção (qualidade x quantidade);
  2. A variedade, especialmente no que se relaciona ao hábito de frutificação, tamanho do cacho; vigor da planta, que pode requerer altura e/ou largura maiores para uma melhor exposição ao sol; maneira que deverá ser podada. Por exemplo, a Nebbiolo é uma variedade que exige uma condução diferente da Merlot, devido as características de frutificação de cada variedade, onde o cacho de cada uma vai surgir são pontos diferentes da planta, o que levará a pensar na exposição do fruto ao sol e outros fatores, que explicam o porquê do sistemas de condução serem diferentes.
  3. As condições do solo e do clima;
  4. A topografia do terreno
  5. O método de colheita, manual ou mecânico;
  6. O custo de instalação;
  7. A conjuntura econômica/rentabilidade do viticultor; Fator este aliado a questão qualidade x produção; também a mecanização ou não de alguns tratos culturais na parte do dossel vegetativo da videira.
  8. A tradição, que também faz parte do terroir. Você aprendeu o que é terroir neste artigo, lembra?

Por quê escolher um sistema de condução? No que ele afeta?

Tipos de Sistema de Conducao - Estruturas

O sistema de condução do vinhedo pode afetar significativamente o crescimento vegetativo da videira (como vão crescer as folhas, os ramos), a produtividade do vinhedo e a qualidade da uva e, consequentemente, do vinho.

As características do sistema de sustentação e de condução da planta exercem esse efeito em função de algumas variáveis, como:

  • Altura e largura do dossel vegetativo (uma espécie de parede de folhas e galhos formadas pela videira, a área onde as folhas estarão espalhadas);
  • Do posicionamento das gemas (aqueles nós que aparecem nos ramos, onde surgirão folhas ou cachos de uva);
  • Dos frutos;
  • Da carga de gemas, ou seja, cachos de uvas e folhas por hectare plantado;
  • E do espaçamento entre fileiras e entre plantas.

A quantidade e a distribuição das folhas no espaço modificam o microclima no interior do dossel vegetativo, e você já viu em nossa postagem sobre o que é terroir, como o micro-clima influencia na produção de uma boa uva.

O sistema de condução e a área foliar determinam o sombreamento do dossel vegetativo, e você também já sabe como o sol é importante para a fotossíntese, porque já falamos sobre isso, na postagem sobre o que é estresse hídrico.

Em grosso modo vamos dizer que videiras com muita sombra produzem uva com valores mais elevados de ácido málico (que não é algo que queiramos demais em nossa uva) e teores mais baixos de açúcar, polifenóis, antocianinas (esses últimos importante para um bom vinho, boa fermentação alcoólica, boa cor e etc.).

Pode, também, afetar a incidência de doenças no vinhedo, algumas relacionadas com a ventilação na zona do fruto.

Por exemplo, a remoção das folhas basais, próximas ao cacho, aumentam a circulação de ar de fora para dentro e de dentro para fora perto da uva, o que causa um aumento da evaporação e secamento das folhas.

Esses fatores diminuem a incidência de doenças fúngicas, pois estas estão condicionadas em sua maioria a se desenvolver em lugares úmidos.

Além de todos os aspectos que se referem a parte vegetativa da planta, todos os outros fatores que influenciam na escolha do sistema devem ser levados em consideração.

Quais são os sistemas de condução mais utilizados? 

Bom, quando falamos de uvas para vinho, a grande maioria dos vinhedos já encontra-se plantado em Espaldeira, sendo que, ainda há produtores que utilizam outros sistemas, como a latada e a manjedoura.

Estes últimos, aos poucos vão adaptando-se a Espaldeira. E para uvas de mesa, suco, a grande maioria continua com a latada como principal sistema de condução, devido a sua boa rentabilidade.

Tipos de Sistemas de Condução Para Videiras

1. Sistema de Condução em Espaldeira

É um dos sistemas de condução mais utilizados atualmente, principalmente nos países do Novo Mundo. O dossel vegetativo é vertical, ou seja, para explicar de uma maneira mais ilustrativa, as folhas e ramos da videira crescem como uma parede.

Sistema de Conducao Espaldeira

Vantagens do sistema de condução espaldeira

  • É atrativo aos olhos, especialmente quando se faz a desponta (que é isso mesmo, retirar as pontas para deixar tudo uniforme, assim não há folhas demais para roubar os nutrientes, nem sobra demais no resto da planta). A espaldeira é um sistema que propicia um vinhedo bem uniforme, quando aplicado todos os tratos culturais adequados (como desponta, desfolha, etc.).
  • Proporciona colheita mecânica fácil e é adaptado à poda mecânica também, embora ainda não muito comum no Brasil, já que tendo o vinhedo nessa posição, máquinas tem passagem fácil entre eles;
  • Os frutos situam-se numa área do dossel vegetativo e as extremidades dos ramos em outra, ou seja, os frutos ficam mais abaixo, e as folhas, mais acima: isto facilita as operações mecanizadas, como remoção de folhas, pulverizações dos cachos, auxiliando no controle da saúde do vinhedo e dos frutos.
  • Adapta-se bem ao hábito vegetativo da maior parte das uvas viníferas; logo, a maioria das uvas para vinho encontram-se conduzidas por esse sistema.
  • Apresenta boa aeração; o que também leva à uma maior facilidade no controle da saúde do vinhedo, além da boa exposição solar que os cachos encontrarão durante a maturação.
  • O custo de implantação é relativamente baixo, menor que o latada, que vamos ver logo a frente;
  • Pode ser ampliado a medida que necessário, pois a estrutura de cada fileira é independente.

Desvantagens do sistema de condução espaldeira

  • Apresenta tendência ao sombreamento quando as filas não são plantadas distantes o suficiente uma das outras, e também quando o terreno não permite uma boa orientação das filas em relação ao sol;
  • A densidade de ramos geralmente é muito elevada, o que nos leva a aumentar a mão-de-obra para alguns tratos. Por esse motivo, não é indicada para espécies muito vigorosas ou para solos muito férteis;

Um aspecto importante na questão da espaldeira é a quantidade da produção. Em média, não se produz mais que 5 toneladas por hectare, o que não é considerado muito, visto que em outros sistemas essa quantia pode dobrar facilmente.

No entanto, você lembra do primeiro critério de escolha dos sistemas de condução? A relação quantidade X qualidade da uva produzida. Logo, por ser um sistema que produz menos uvas, produzirá menos vinho. É comum que o vinho proveniente de uvas plantadas no sistema de Espaldeira sejam de melhor qualidade e custem mais caro que vinhos provenientes de uvas produzidas pelo sistema de Latada.

2. Sistema de Condução Latada

O sistema de condução latada é também chamado de pérgola. É o sistema mais utilizado na Serra Gaúcha, RS e no Vale do Rio do Peixe, SC.

Atualmente quando fala-se na produção de uva para vinho fino, esse sistema vem sendo trocado aos poucos pelo Espaldeira.

Sistema de Conducao Latada

Na América do Sul tem alguma expressão na Argentina, Chile e Uruguai. Na Europa, aparece em determinadas regiões vitícolas, especialmente na Itália, com denominações e formas diferenciadas.

Uma das causas de a Latada ter sido popular no Brasil, é devido a influência dos imigrantes italianos, que foram os primeiros produtores de uva no país.

O dossel vegetativo é horizontal (parece-se como um teto de uva, diferente da espaldeira que faz-se a analogia com uma parede).

As varas são atadas horizontalmente e não verticalmente como na Espaldeira, aos fios do sistema de sustentação do vinhedo.

Vantagens do sistema de condução latada

  • Proporciona o desenvolvimento de videiras vigorosas, que podem armazenar boas quantidades de material de reserva, por isso, bastante utilizada ainda para variedades de mesa e suco;
  • Permite uma área do dossel extensa, com grande carga de gemas. Isto proporciona elevado número de cachos e alta produtividade;
  • Em função de sua produtividade, possui uma boa rentabilidade econômica especialmente em pequenas propriedades;
  • É de fácil adaptação à topografia de regiões montanhosas, como a Serra Gaúcha e o Vale do Rio do Peixe.

Desvantagens do sistema de condução latada

  • Os custos de implantação e de manutenção do sistema de sustentação são elevados;
  • A posição do dossel e dos frutos situados horizontalmente acima do trabalhador causa transtornos à execução das práticas culturais; imagine ficar o dia todo olhando para cima!
  • A posição horizontal do dossel e o vigor excessivo das videiras podem causar sombreamento, afetar negativamente o microclima, a fertilidade das gemas e a qualidade da uva e do vinho, dificultando a insolação dos cachos, ventilação da área foliar, entre outros problemas;
  • O elevado índice de área foliar, que nada mais quer dizer, que a grande quantidade de ramos e folhas, se não for bem manejado, pode proporcionar maior umidade na região dos cachos e das folhas, o que favorece o aparecimento de doenças fúngicas, e se a uva não é boa, o vinho também não será.

O manejo do dossel de um vinhedo conduzido em latada pode se tornar relativamente caro e trabalhoso.

Há ainda mais necessidade de realizar-se a poda verde, especialmente a desbrota, a desfolha e a desponta, a fim de que haja uma melhor distribuição espacial das folhas e uma maior captação da radiação solar.

3. Sistema de Condução Manjedoura ou Lira

É um sistema de condução que foi desenvolvido na França, em Bordeaux.

Obteve incentivos para sua implantação no Uruguai, principalmente, e demonstrou bons resultados. Sua principal característica é que a videira é conduzida como se fosse um “Y”.

Sistema de Conducao Manjedoura ou Lira

Pode-se dizer que tentou-se criar um meio do caminho entre os sistemas latada e espaldeira.

No Brasil não se popularizou devido a dificuldade para a adaptação aos tratos culturais, como poda, desbrota e outros.

Algumas das vantagens do sistema de condução em manjedoura ou lira

  • Apresenta grande área foliar e superfície de área foliar, o que faz com que a planta possa realizar bastante fotossíntese se bem exposta ao sol;
  • Propicia boa produtividade, mas menor que a do latada;
  • Torna-se fácil posicionar os ramos;
  • A colheita mecânica é fácil de ser feita;
  • Proporciona uma boa qualidade da uva quando bem manejado, e pode produzir ótimos vinhos;
  • Pode ser ampliado a medida que for necessário, pois as fileiras são independentes.

Desvantagens do sistema de condução em manjedoura ou lira

  • Em solos férteis, especialmente com tipos de uva vigorosa, desenvolve demasiadamente o dossel vegetativo, ou seja, produz folhas e ramos muito acima do necessário, fazendo com que a planta diminua a produtividade de cachos, por isso obriga a realização da poda verde na base e no centro do dossel;
  • Em solos muito férteis há um desenvolvimento exagerado das feminelas laterais (pequenos ramos, finos e com poucas folhas) para o centro do sistema de condução, o que é relativamente difícil de controlar, isto altera o microclima, geralmente deixando-o mais úmido, influenciando negativamente na qualidade da uva, facilitando o surgimento de fungos, além de dificultar a insolação do cacho e ventilação;
  • Ao proceder o manejo da parte interna do dossel vegetativo, o viticultor entra em contato com a folhagem que contém fungicidas e inseticidas, o que para a saúde do produtor não é legal.

O sistema de condução utilizado influencia no preço do seu vinho?

Acredito que esses são os três principais sistemas de condução utilizados hoje na vitivinicultura.

É muito importante saber como a uva que produz o seu vinho é cultivada. Porque?

Essas informações servem para além de ter-se uma ideia da qualidade do vinho, entender também sobre mais um fator que implicará no preço final do vinho que você está consumindo.

Uma vez que nós observamos que um dos principais fatores que influenciam na escolha do sistema de condução é a relação de qualidade da uva X quantidade de uva produzida.

Ou seja, a qualidade da uva vai influenciar diretamente na qualidade do seu vinho. E no seu valor.

Conclusão

Pessoal, eu poderia falar por dias dos aspectos da viticultura, sobre a cultura da uva, porque acho que é muito importante entender de onde vem a uva, para que assim valorize-se o vinho.

Antes de ele chegar na sua taça tem um longo caminho, e grande parte dele não é feito dentro da vinícola, na vinícola pode-se dizer que é o lugar de “lapidação” da uva, e a gente não conhece um bom diamante que surgiu de uma pedra qualquer, certo?

LEMBRE-SE SEMPRE
Um bom vinho só pode surgir a partir de uma boa uva!

Por favor, não deixem de contribuir com perguntas e comentários, opiniões sobre o tema, tornando nosso blog cada vez mais completo.

Ilustrações: Marcos Marcon.
Este artigo e todo o seu conteúdo está licenciado sob uma Licença Creative Commons 4.0 Internacional. Copyright © 2014 – 2019 – Vem da Uva.
A utilização está liberada para uso em cursos e palestras, desde que mantido os créditos.

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11 Comentários. Deixe novo

  • laurindo zandonai
    2 de out, 2020 17:23h

    Fiz um pequeno parreiral de uva espaldeira, com três alturas de arame. Após a brotação, quando o galho chega no último arame, ele deve ser cortado ou devemos deixar crescer mais ainda, com o que, vai caindo para os lados?

    Responder
  • Marcus Coelho
    19 de jan, 2020 11:43h

    Uma dúvida, Marcos. Qual a produtividade média por parreira em cada sistema? Estou pensando em plantar em casa para fazer vinho e queria ter uma ideia melhor de quantas devo plantar. A produtividade por hectare acaba dizendo pouco para mim.
    Em tempo, gostei bastante do site. Linguagem fácil associada a desenhos muito bem explicados. Parabéns.

    Responder
    • Marcus, essas são perguntas difíceis de responder porque vai depender muito do seu terreno, idade das plantas, etc. A mesma planta pode produzir de forma totalmente diferente dependendo da região do país onde vc vai fazer o plantio, da altitude, da variedade da uva que será plantada (acho que essa deve ser sua primeira preocupação, quais variedades você irá plantar).

      Com mais detalhes assim, talvez eu consiga te ajudar melhor. Se quiser, mande um e-mail direto pra mim no marcos.marcon@vemdauva.com.br

      Abraço Marcus!
      Marcos Marcon.

      Responder
  • Ney Teixeira
    29 de nov, 2019 21:05h

    Porém quero dizer que achei a sua web.
    Muita fácil para as pessoas entenderem.
    Pois você vai direto nos assunto, e não fica enchendo linguiça.
    PARABENS CONTINUE

    Responder
  • Ney Teixeira
    29 de nov, 2019 20:59h

    Bom Que também brasileiro porém me estabelecendo na terra do vinho verde .
    digo que foi difícil perder este modo brasileiro de dizer PLANTAR UVAS.
    Porque depois de levar uns puxões de orelha.
    hoje já digo PLANTAR VINHAS.
    Para se colher uvas.

    Responder

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